LETRA DE CANÇÃO É OU NÃO POESIA? (parte final)
Por Wagner Azevedo Pereira
LETRA DE CANÇÃO É OU NÃO POESIA? (parte final)
4 – O gênero Letra de Canção usado em sala de aula.
A utilização da letra de canção nos livros didáticos tem sido feita de maneira muito confusa. É usada de maneira mais subjetiva do que objetiva. Geralmente o trabalho com a poesia e a letra de música está atrelado a alguns problemas, às atividades e aos exercícios inseridos nos livros didáticos que tratam desse gênero discursivo, como pretexto para conduzir os alunos a analisar, examinar conteúdos gramaticais e ortográficos, deixando de lado o que deveria ser o mais importante e essencial, que é seu valor intrínseco: a essência literária que prioritariamente tais textos possuem.
Sugeriremos algumas implicações pedagógicas para que suas práticas tenham bom proveito nas práticas discursivas das matérias de língua portuguesa e literatura.
Sempre ao abrirmos um livro didático do ensino médio encontraremos uma letra de música sendo trabalhada como se fosse poesia. Sabemos da importância que tem a canção, entretanto ela não deve ser reduzida a um texto vago ou a uso apenas de entretenimento.
Ao considerar a canção como gênero autônomo, o professor deve explorar toda a sua dimensão, qual seja, proporcionar aos alunos uma educação dos sentidos (estética), consciência crítica, exercícios de leitura semiótica (a vasta interação pluridirecional que relaciona todos os elementos que uma canção pressupõe: cantor, compositor, melodia, história, etc.). Essa proposta não tem o objetivo de formar compositores ou cantores, mas sim, pessoas que adquiram a capacidade de perceber melodias; de conhecer textos, seus sentidos e efeitos; além de formar ouvintes críticos, que saibam distinguir as variadas formas de composições, no caso seus estilos.
Trabalhar com canção é um procedimento complexo por ser ela um produto discursivo que possui em sua elaboração a criação solitária ou em parcerias da letra e da melodia com o auxílio ou não de um instrumento musical, o componente importantíssimo que é o arranjo, além do processo de registro que engloba gravação e instalação em suportes: CD, mp3 e outros (com tudo o que envolve escolhas, atos, gestos interdiscursivos e semióticos).
É por tudo isso que chegamos a crer ser complexo trabalhar em sala de aula de uma maneira pragmática com o gênero letra de canção.
5 – Conclusão
Esta reflexão relativa ao fato de a letra de música ser ou não poesia com certeza está longe de acabar, sempre será um tema polêmico devido às argumentações bem fundadas tanto dos compositores/letristas quanto dos poetas.
Apesar das divergências sempre renovadas entre autores que defendem e outros que atacam a valorização do elemento musical na composição poética, vale a pena lembrar que a versificação implica certa dose de musicalidade, orgânica ou abstrata, isto é, espontânea ou esquemática, resultante ou normativa da ordenação vocabular.
É necessário, portanto, que os alunos sejam estimulados à audição musical quando se trabalhar com letra de música em sala de aula. Mas só isso não basta. É necessário todo o conjunto intrínseco: a observação e interação do texto e da melodia, a análise dos meios técnicos que trouxeram a canção e todo o seu processo de produção. Que eles tenham a consciência de que toda canção que chega à sociedade é uma produção coletiva, há participação de várias pessoas, uma enorme cooperação diversificada de diversas áreas (músicos; técnicos; assistência de arranjo; de acompanhamento vocal; instrumental; de produção discursiva periférica, no caso encartes, as linguagens: pinturas, desenho, artes plásticas, fotografia etc.).
Gêneros que possuem estruturas comuns e são historicamente parecidos, o poema e a letra de canção devem ser trabalhados com as suas particularidades apresentadas e a poesia analisada como tal. É necessário diferenciá-los. Outra prática passível de ser explorada seria a própria expressão da música, a harmonia e a melodia da música sem o acompanhamento da letra (nesse caso o professor deve ter conhecimento de teoria musical e percepção auditiva também musical). Por outro lado, não se exige que o professor seja um músico ou compositor, mas ele precisa ter sensibilidade e visão crítica.
Esse é nosso propósito com esse trabalho sobre a letra de música em sala de aula: explorar a riqueza da linguagem da canção. A grandiosa expressão da música, a nuance dos sons das palavras e seus sentidos polifônicos.

Wagner Azevedo Pereira nasceu em Nova Iguaçu/RJ – Brasil. Formou-se em Letras, com Pós-graduação (lato sensu) em Língua Portuguesa, cursa Direito, formações na Universidade do Estado do Rio de Janeiro; Doutor Honoris Causa (OMDDH e APALA-RJ). Tem 36 livros publicados: 21 dicionários, 2 livros de contos, 1 de sonetos e 12 participações em antologias. Colaborou com o site E-Dicionário de Termos Literários (online) com seis verbetes inéditos: EUS, ERÓTEMA, PORANDUBA, PAI-JOÃO, ANÁBASE e CATÁBASE. É 2º Vice-Presidente do IICEM (Instituto Internacional Cultura em Movimento) e colunista da rádio Tropical AM 830, do RJ (www.tropicalam830.com), com o quadro O DICIONÁRIO ABERTO, todo 1º sábado de cada mês às 17 horas (horário de Brasília).